sábado, janeiro 13


Papa não vem a Portugal como retaliação contra o Governo socialista

"Vaticano recusa "aproveitamento" de Sócrates depois
das questões do Protocolo e do referendo ao aborto. Vital Moreira devia demitir-se.

É a primeira derrota política do primeiro-ministro em dois anos. O Papa recusa-se a vir a Portugal. Não quer dar ao primeiro-ministro a possibilidade deste se aproveitar politicamente da visita, depois de ter humilhado a Igreja Católica com a questão do protocolo de Estado, de ter mandado retirar os crucifixos das Escolas e sobretudo de ter mandado fazer um referendo sobre um aborto, onde provavelmente ganhará a abstenção, pois que a agenda político-social do Governo está divorciada dos interesses do País. Surpreendentemente, depois de ter apoiado sempre o poder político em Lisboa, desde a Primeira República, com excepção do anacronismo da guerra colonial, a Igreja Católica e o Vaticano põem-se de fora e excluem relações com Sócrates. Percebendo a gravidade das consequências, o primeiro-ministro já recuou no aborto. Mas, o primeiro-ministro vai ter que mexer ainda na Comissão das Comemorações do Centésimo Aniversário da República. Vital Moreira deveria apresentar a demissão, depois do embaraço causado à diplomacia e ao Governo de Portugal.
O Papa Bento XVI não vem este ano a Portugal. É com a maior clareza e toda a violência diplomática que o Vaticano responde ao convite do primeiro-ministro para que o Papa Bento XVI visite oficialmente Portugal, no âmbito das comemorações dos 90 anos das aparições de Fátima e para a inauguração da nova Basílica da Santíssima Trindade. Ao contrário de António Guterres, depois dos lamentáveis episódios com o protocolo de Estado e com o referendo sobre a Interrupção Voluntária da Gravidez, José Sócrates não vai contar com o apoio da Igreja Católica, em Portugal ou no Mundo.
José Sócrates tentou ainda na última semana controlar os estragos. Pediu aos socialistas para que não ataquem os portugueses que apoiem o não no referendo ao aborto de 11 de Fevereiro. Foi um recuo, depois de perceber que a Igreja se movimentou e mobilizou para provar que o aborto não pode ser um método contraceptivo e que o Estado não deve usar o dinheiro dos contribuintes para pagar abortos voluntários, preterindo os restantes casos do Serviço Nacional de Saúde.


Uma questão fracturante

Foi artilharia pesada. No início, quer os partidos da direita, quer mesmo a Igreja Católica, tinham dado sinais claros que a questão do aborto era uma questão que não era fracturante na sociedade portuguesa, e que por isso a Igreja não se envolveria. Não é uma questão religiosa. É uma questão moral e do foro da consciência dos cidadãos.
Estava, desse modo, dado o mote para que o assunto, de menor relevância política para os portugueses, pudesse passar ao lado de debate partidário.
Mas empurrado pela esquerda do PS, o primeiro-ministro viu no Referendo ao Aborto uma oportunidade para esmagar a direita e humilhar a Igreja Católica, anunciando a sua entrada na campanha para o referendo e sobretudo acentuando a fractura política.
O primeiro-ministro e o ministro da Presidência não avaliaram que estavam a cometer o maior erro político do executivo socialista desde a sua posse. Imediatamente esta posição gerou a reacção do Patriarcado e dos partidos da direita, apesar da incapacidade de Marques Mendes para gerir a situação no PSD.
A questão passava a ser política, como Sócrates queria, e a Igreja Católica anunciava então que se iria envolver profundamente também na questão.


Sócrates quis recuar no conflito com a Igreja

Ao ver o enorme estrago feito, o primeiro-ministro quis imediatamente recuar, anunciando que respeitará o resultado do referendo, mesmo que ele não seja válido juridicamente: ou seja, mesmo que a abstenção condene o referendo (só vale se votarem mais de 50% dos eleitores), se o não ganhar, a lei ficará como está, não sendo alargado por mais duas semanas a possibilidade de aborto voluntário.
Depois disso, José Sócrates dá sinais de não querer discutir a questão e passar ao lado dela. A semana passada deu mais um passo, ao exigir tolerância ao PS em face do Não ao Aborto.
Mas, tudo jogado, o primeiro-ministro chegou tarde. Porque a questão religiosa que Sócrates sem querer acabou por protagonizar, às mãos dos jacobinos ex-comunistas e anticlericais, que estão próximos do seu Governo, acabou por ter resultados.
De longe toda a questão religiosa está a ser pilotada de Coimbra por Vital Moreira, que tem os seus agentes no Governo e junto à maioria socialista.
É uma desforra para se fazer desde o Verão Quente, quando a esquerda portuguesa inteligentemente evitou repetir os erros da Primeira República, nomeadamente evitando a questão religiosa. E Sócrates não percebeu que essa deriva anticlerical em Portugal não teria o preço da espanhola, com o aborto, os casamentos homossexuais e o protocolo. Porque, ao contrário, em Portugal o peso da Igreja é ainda bastante significativo e, sobretudo, a Igreja Católica de Portugal nunca esteve colada ao regime e ao Estado quanto a espanhola, sabendo manter a sua autonomia e a sua identidade, mesmo nos piores momentos de deriva anticlerical. E, sobretudo, porque aqui, a Igreja está disponível para pagar pela mesma moeda ao poder político, sabendo que Cavaco Silva nunca permitirá "os disparates" de Jorge Sampaio.
Depois da humilhação da posição da Igreja Católica no protocolo de Estado, que o primeiro-ministro José Sócrates acabou por permitir, numa cruzada feita pelos anticatólicos do PS, comandados de fora por Vital Moreira, que o próprio Governo socialista nomeou para organizar as comemorações do centenário da República -momento sensível relativamente ao sentimento católico dos portugueses e que o Governo socialista poderá ter deixado nas mãos de um indivíduo que tem dado mostras de querer perseguir a Igreja portuguesa, abrindo as feridas da Primeira República, que ninguém quis levantar nos últimos trinta anos de Terceira República -, a questão dos crucifixos, levantada pelo mesmo Vital Moreira, viria a ter o apoio do Governo socialista e finalmente o aproveitamento do referendo ao aborto, como questão fracturante entre a sociedade civil e a Igreja e entre a direita e a esquerda na cena política portuguesa, desagradaram profundamente ao Vaticano, sobretudo, vindo de um Estado que, apesar de laico, nunca deixou na alma popular de considerar, tal qual o fez pela primeira vez, D. João V, Nossa Senhora como Rainha de Portugal.


Um sinal do Vaticano

Ora é exactamente este sinal claro que o Vaticano quer dar a José Sócrates. O Papa Bento XVI recusou, diplomaticamente, por questões de agenda, o convite para visitar Fátima em Outubro, por ocasião da inauguração da Igreja da Santíssima Trindade.
De acordo com a Conferência Episcopal Portuguesa, que na terça-feira fez o anúncio, o Santo Padre não virá a Fátima durante o ano de 2007 para presidir à inauguração da nova basílica de Fátima. Até Outubro, data prevista para a cerimónia de abertura da Igreja da Santíssima Trindade, o Papa Bento XVI deverá nomear um cardeal para o representar em Fátima. O escolhido presidirá às cerimónias de encerramento dos 90 anos das Aparições, na Peregrinação Internacional Aniversária do 13 de Outubro, e à inauguração da Igreja da Santíssima Trindade.
Para evitar agravar na opinião pública o conflito, a Conferência Episcopal deu algum espaço de manobra ao Governo socialista. Segundo ela, a ausência de Bento XVI durante o decorrer de 2007 já estava, de alguma forma, prevista, face à demora no processo de canonização dos Pastorinhos. O objectivo dos responsáveis do Santuário de Fátima seria juntar a inauguração da nova basílica com a canonização de Francisco e Jacinta.
Em 2006, por ocasião das comemorações dos 90 anos das Aparições, o presidente da CEP e o bispo de Leiria-Fátima pediram uma audiência ao Papa para fazer o convite, mas nem sequer esse pedido foi atendido pela Santa Sé. Segundo a Conferência Episcopal Portuguesa, Bento XVI gostaria de vir a Fátima, mas não era possível no ano de 2007.
D. António Marto, bispo de Leiria-Fátima, optou por não tecer qualquer comentário sobre o assunto, apesar da diplomacia querer contornar a questão central da ofensiva anticatólica da maioria socialista.


A primeira derrota de Sócrates

José Sócrates tinha programado, tendo em vista a repetição da maioria absoluta em 2009, todo um conjunto de iniciativas internacionais que o apresentariam à opinião pública como um estadista de primeiro plano. A visita à China, já no fim do mês de Janeiro, seria o primeiro passo para a preparação da Presidência Portuguesa da União Europeia, o que, conjugado com a visita de Cavaco Silva à Índia, resultaria numa ofensiva na Ásia, que poderia trazer benefícios também económicos para Portugal. Depois a própria presidência da UE e a tentativa de trazer em 2002 a conferência da NATO para Lisboa. A visita do Papa a Lisboa e a Fátima seria consagração final, a cereja sobre o bolo, para que José Sócrates tivesse o tapete de honra para a maioria absoluta.
Mas, pela primeira vez em dois anos, o Governo socialista falhou. É a primeira derrota política de José Sócrates. Culpado por não ter conseguido travar a ofensiva anticlerical dos ex-comunistas, Sócrates sofre o primeiro revés. O Papa não vem a Portugal, não por nenhuma questão de agenda, como diplomaticamente se fez constar, mas porque não quer emprestar o seu prestígio a um primeiro-ministro que permitiu a afronta do Protocolo, que defende o aborto e mandou retirar das escolas o símbolos da fé católica. É a primeira derrota política de José Sócrates. A segunda poderá ser no próximo dia 11 de Fevereiro, com a derrota do "sim" no referendo ao aborto.
José Sócrates só pode estar preocupado. E os sinais começam a ser evidentes, sobretudo no recuo na questão do aborto. Sócrates percebeu já tarde o embaraço, mas dá sinais que quer recuperar o tempo perdido, sobretudo porque a ruptura com a Igreja pode ser também fracturante em matéria de Regime. E o passo seguinte poderia passar, aliás, pelo próprio distanciamento do Governo em face de Vital Moreira, visto nos meios católicos como o instigador da luta anticatólica do Governo Sócrates. A sua demissão da Comissão para as Comemorações do Centenário da República poderia ser mais um sinal do primeiro-ministro, no sentido de amenizar a má disposição da Igreja e do Vaticano."

In Semanário, 12 de Janeiro de 2007

1 comentário:

Anónimo disse...

Las empresas multinacionales buscan el Portugal de Orden y Prosperidad (Lusitania Felix)del Profesor Cavaco Silva y del Ingeniero Señor Sócrates.