terça-feira, junho 17


Corruptissima respublica, plurimae leges




"No domínio financeiro, a legorreia praticada e a anunciada (como no caso da sempre adiada «reforma da contabilidade pública») chegaram a termos inimagináveis. Mudam-se pormenores em três artigos – e aí vem uma lei nova. O que faltou para nos modernizar – e é muito – continua a faltar; o que já tínhamos muda de vestuário de forma verbal vezes sem conta... para ficar pior. (...) Estejam atentos os juristas e critiquem sem medo, pois é esse o seu dever. Ao rever as remissões de Direito positivo – que, por vezes, são só novas palavras para as mesmas coisas – pensámos muita vez na tão verdadeira frase de Tácito: «Corruptissima respublica, plurimae leges.»

Sousa Franco, Prefácio de 1991 à obra "Finanças Públicas e Direito Financeiro", pp. XIII/XIV


A legorreia de que nos fala o Professor Sousa Franco está em consonância com a verborreia todas as semanas praticada pelos nossos ilustres deputados na Assembleia da República. Cada Partido fala de si e para si. O que os eleitores pretendem em democracia é, acima de tudo, a sua representação plena e competente. Ora hoje perde-se mais tempo em discussões baratas e circulares, do que na resolução prática dos problemas concretos que o País enfrenta já há várias décadas. E isto reflecte-se, obviamente, na legislação da Nação.
Um bom exemplo de estabilidade legislativa – antítese da governação democrática nos países sul-europeus – foi o Estado Novo, que pretendia reformar intensamente o Estado, mas de forma sustentável e duradoura.
Alguns diplomas normativos demoravam vários anos a serem elaborados e revistos. Faziam-se leis para durar e governar. Eram leis para o País.
Ora com a Revolução de Abril e toda a azáfama libertadora, abriram-se espaços ao legislador irresponsável e noviço. Com a instabilidade dos Governos – ora cai um, ora cai outro – conjuntura que é própria de um pós Revolução, surgiram “leis instáveis”, isto é, pouco úteis e facilmente modificáveis. Leis de momento, de impulso. Os juristas, alguns forçosamente calados, nada puderam fazer, e as leis foram surgindo e caindo. Nem tempo havia para as conhecerem, as estudarem, as perceberem. Só é possível aplicar bem uma lei quando o intérprete tem tempo e condições para a perceber e a adequar à realidade.
Actualmente este é ainda um problema nacional. Com legislaturas de quatro anos, em que nem todas chegam ao fim, os Governos que tomam posse não pretendem continuidade e cada um quer reformar à sua maneira. É preciso realçar que as verdadeiras reformas, para “darem frutos”, fazem-se continuamente, com pequenos aperfeiçoamentos a nível de momento, não a nível de estrutura. O que é bem feito demora tempo. Estamos, por assim dizer, a construir casas provisórias, facilmente destruídas por uma pequena tempestade.
Para ser possível garantir a democracia urge praticá-la. Isto é, recriar os seus pilares fundadores com normas estáveis e coerentes. Harmonizar sistemas de forma responsável. Restabelecer o sentido de Estado. Sobrepor o País ao partido político, não por ideal de autoridade ditatorial, mas por ideal de servir o País, governar para o País e no seu interesse. É para ele que existe a democracia, não é para o Partido A dizer mal do Partido B e vice-versa, sem avanços concretos no progresso nacional. O que se pretende dos Partidos é a discussão e o debate informado. Não a luta corriqueira pelo poder.
Se observarmos melhor, as normas ainda hoje aplicáveis, pelo menos de forma aparente, salvo algumas excepções – por exemplo, o Código do Trabalho e o Código da Contratação Pública – são anteriores à Revolução da Liberdade. Referi, “pelo menos de forma aparente”, porque não são poucos os casos em que achamos que devemos aplicar os artigos do Código Civil para a responsabilidade civil e existe uma norma recentemente criada, que poucos conhecem, que revoga certo artigo, certa alínea. Há uma vontade de alterar e legislar que torna prejudicial o funcionamento das instituições sociopolíticas e fundamentalmente, o funcionamento da Economia.
Certo é que, hoje em dia, com a globalização dos mercados, a mundialização das trocas e a rapidez incessante com que se inova, seja natural o surgimento quase diário de novas leis a regular o que é novo e desprotegido. Há, porém, uma despreocupação irresponsável em relação ao que se deve alterar e ao que tem de permanecer intacto. Repare-se por exemplo que a nível de legislação comercial, o nosso Código Comercial data do século XIX e ainda hoje é actual e aplicável, obviamente com algumas inovações, expectáveis neste sector, sempre em constante mudança. Temos, noutra realidade, leis novas que rapidamente se tornam obsoletas, substituídas por outras que, como é referido no texto do Professor, “mudam de vestuário de forma verbal vezes sem conta... para ficar pior.”
Este é, quanto a mim, um exemplo a seguir. Não é possível desenvolver, sem estabilidade. Não é possível construir bem, sem fundações sólidas. Assim como não é possível ser um bom matemático sem saber a tabuada, não é possível ser um bom jurista se não souber o valor que tem uma lei e a toda a responsabilidade e consciência com que deve ser elaborada.
Para concluir, basta-me dizer aquilo que todos vêem mas que poucos dizem. Concordando com a citação oportuna do Professor Sousa Franco, “Corruptissima respublica, plurimae leges”, é esta a imagem política de Portugal.

3 comentários:

Anónimo disse...

boa leitura juridica da realidade. As leis fazem o pais.

Cumprimentos saudosos de quem ja nao o ouvia(lia) ha algum tempo.

Anónimo disse...

Voces sao uns retrogados, so o q é antigo é q é bom, fodasse. Quais fundaçoes solidas, tradiçao e coisa que faz mal ao homem. O homem nao precisa de fundaçoes solidas, precisa é de liberdade e tendas, para que possa viver aqui e ali, nao se percebem a metafora. sao essas fundaçoes solidas que acabam com o homem e com a sua essencia. nao imponham barreiras seus extremistas nojentos.
quero ser livre e continuar assim!

Ze do Telhado disse...

Parece-me claro que o senhor não percebeu a mensagem do texto. Mais, o senhor já vinha com uma opinião formada acerca do conteúdo do blogue. Assim torna-se difícil estabelecer um debate com alguém que não se fundamenta, não argumenta, não discorda nem contraria, apenas grita "balas de pólvora seca". O seu comportamento é de quem destrói por destruir.
O senhor é, digamos, uma vergonha para si mesmo e para aquilo que representa.

Cumprimentos cordiais sr."anónimo".